O desafio do calendário do futebol brasileiro | Afonso Ribeiro

Foto: Nayra Halm/ Staff Images Woman/ CBF
Bola de futebol com escudo da CBF

É um tema que você provavelmente já encontrou ou discutiu com amigos. Existe, de fato, uma forma de reduzir a carga de jogos entre os principais clubes do Brasil? Quais são as complexidades envolvidas na construção do calendário das competições que precisam equilibrar os compromissos e interesses de entidades, clubes, estádios e emissoras de TV?

O quadro é alarmante em duas vertentes: equipes que enfrentam um calendário apertado e aquelas que jogam pouquíssimo. Este último grupo, geralmente, é formado por clubes que participam apenas dos campeonatos estaduais e, com sorte, da Série D. Em cenários extremos, algumas equipes podem atuar em competições oficiais durante apenas um mês em toda a temporada.

“Para os clubes menores, os campeonatos estaduais representam uma fonte importante de receita, geram empregos para a economia local, atraem investidores e recebem apoio das prefeituras. Além disso, eles servem como uma vitrine para os clubes buscarem vagas em competições nacionais e assegurarem um calendário robusto no ano seguinte”, comentou Neivaldo Júnior, diretor de competições da Federação Cearense de Futebol (FCF).

Por outro lado, as principais equipes do futebol nacional podem competir em quatro a seis torneios, tanto nacionais quanto internacionais. Em 2023, por exemplo, o Fortaleza disputou 78 partidas ao chegar na final da Sul-Americana, enquanto o Botafogo, campeão da Libertadores de 2024 e participante da Copa Intercontinental, atuou em 75 jogos.

Esses números elevados de jogos acarretam um desgaste físico e psicológico nos atletas e geram um certo cansaço nos torcedores devido ao grande número de partidas ao longo do ano, o que acaba desvalorizando o produto.

Neivaldo, que também já atuou na Confederação Brasileira de Futebol (CBF), explica que a hierarquia na distribuição das datas começa pelas datas Fifa, seguindo pela Conmebol, depois pela CBF e, por fim, pela FCF. Assim, uma mudança feita por uma entidade superior pode afetar as demais. Além disso, há a possibilidade de conflitos de datas dependendo do avanço das equipes em alguma competição ou da disponibilidade dessas datas caso haja eliminação.

“A flexibilidade varia conforme a agenda disponível de cada equipe. Alguns jogos permitem ajustes, enquanto outros são rígidos”, diz o dirigente, que também ressalta a necessidade de respeitar o intervalo de 66 horas entre partidas e a grade das emissoras que detêm os direitos de transmissão.

Entrevista com Neivaldo Júnior, diretor de competições da FCF

O POVO – Quais são os maiores desafios ao elaborar o calendário de competições para equipes que também jogam em competições nacionais e internacionais?

Neivaldo Júnior – A principal dificuldade está na disponibilidade de datas. No futebol cearense e brasileiro, seguimos uma hierarquia: primeiro, consideramos as datas Fifa; depois, a Conmebol estabelece o calendário das competições internacionais; a CBF publica suas datas de competições nacionais; e, finalmente, organizamos o calendário estadual, estruturando as competições profissionais e de base de forma a evitar conflitos.

OP – É possível prever possíveis conflitos de datas e ajustes quando se elabora o calendário?

Neivaldo – Sim, ao analisarmos os cronogramas, temos uma ideia das datas base em que as competições devem ocorrer. Essas datas servem como referência para agendar as partidas e, posteriormente, para indicar onde podemos realizar ajustes — seja antecipando ou adiando — respeitando a hierarquia das datas.

Quanto à possibilidade de alteração, isso varia dependendo da agenda de cada equipe. Alguns jogos apresentam maior flexibilidade, enquanto outros possuem pouca margem para mudanças.

OP – Como lidar com eventuais mudanças nos calendários e equilibrar os interesses de clubes, entidades e emissoras?

Neivaldo – Mudanças nos calendários são normais e algumas já conseguimos prever ao publicarmos outros calendários. Quando recebemos um pedido de alteração, é crucial verificar se a mudança se alinha com a transmissão do jogo. Existem horários em que a emissora responsável não tem espaço na grade para atender à solicitação do clube.

Além disso, precisamos considerar se os jogadores das duas equipes já teriam superado as 66 horas de intervalo estipuladas pela Lei Geral do Esporte; se houver alteração, é necessário garantir que não transtorne o próximo jogo de ambas as equipes, além de considerar a transmissão e a disposição da emissora em mudar sua grade.

Não é apenas uma questão de alterar um jogo; há diversos fatores que precisam ser avaliados para que a mudança realmente aconteça.

OP – O que poderia ser feito para melhorar o calendário do futebol brasileiro e reduzir o alto número de jogos? No caso dos Estaduais, seria viável, do ponto de vista comercial e esportivo, ter uma competição mais longa apenas com equipes menores?

Neivaldo – Quando falamos de Estaduais, há defensores do fim dessas competições, geralmente baseados na realidade das equipes que participam de torneios regionais, nacionais e internacionais e que enfrentam um calendário mais sobrecarregado. Embora entendamos essa crítica, consideramos que é um argumento egoísta. Os Estaduais são muito importantes: eles definem os campeões que garantem vagas na Copa do Brasil do ano seguinte, na Série D do Campeonato Brasileiro e em competições regionais. Imagine abrir mão de um torneio tão significativo?

Para os clubes menores, os Estaduais representam uma vital fonte de renda, promovem empregos para a economia local, atraem investidores e recebem apoio das prefeituras, além de servirem como vitrine para que eles busquem vagas em competições nacionais e assegurarem um calendário mais estruturado para o ano seguinte.

Quanto à ideia de uma competição mais longa apenas com clubes pequenos, eu não acredito que seria tão atraente para eles. Num campeonato tradicional, especialmente na elite, a presença de grandes clubes é um imã para os atletas, que enxergam ali uma oportunidade de visibilidade em confrontos com equipes que lotam estádios e contam com jogadores renomados.

Muitos desses clubes menores, além disso, não possuem um calendário durante todo o ano. Normalmente, eles firmam contratos para um período de cerca de quatro meses, apenas para o Estadual. Se criássemos uma competição mais longa, como eles sustentariam suas equipes e funcionários sem uma fonte de renda adequada?

Mariana Beltrão

Sou redatora, revisora e tradutora de textos, formada em Letras e em Filosofia, estou sempre em busca de conhecimentos. Atualmente escrevo para o portal Folha de Parnaíba, sempre buscando as últimas notícias para os leitores.

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