Faz anos que a venda de mando de campo no futebol brasileiro continua a ser feita na obscuridade. A troco de quê?
Recentemente, entre a surpreendente morte do Papa e as constantes notícias sobre a contratação e demissão de técnicos, talvez você não tenha notado que o Botafogo-PB vendou seu mando de campo para enfrentar o Flamengo. O jogo, que não será realizado na Paraíba, mas sim no Maranhão, promete gerar uma receita superior a R$ 6 milhões, segundo a diretoria do clube. Contudo, essa cifra é questionável, visto que a arrecadação da bilheteira da partida pela Copa do Brasil não costuma atingir esse valor.
Negócios desse tipo costumam passar despercebidos, sendo noticiados apenas como “tal clube vendeu o mando de campo por milhões de reais”. À primeira vista, parece um bom acordo financeiro, pois os recursos podem cobrir pendências salariais ou servir para melhorias na infraestrutura, conforme uma das promessas dos donos do Botafogo-PB. O debate surge, no entanto, por conta da “mudança” do mando de campo.
A polêmica se intensificaria se a informação fosse apresentada de forma diferente: “Um empresário adquire o mando de jogo e leva Botafogo-PB x Flamengo para São Luís”. Isso altera a percepção, não é mesmo? O problema reside no fato de que o nome desse intermediário geralmente não é revelado, pois ele não tem interesse em se expor, e até agora, nem a CBF, nem federações, clubes ou a imprensa têm se mobilizado para esclarecer a situação.
Vamos entender como esse agente opera. Normalmente, ele oferece ao clube um valor fixo para um jogo contra um oponente com grande torcida, como Flamengo ou Corinthians. Se, por exemplo, ele negociar uma quantia de R$ 1 milhão, precisa garantir que a arrecadação da partida chegue, pelo menos, a R$ 2 milhões para cobrir essa despesa e outras taxas, de modo que o lucro totalize uma receita que compense o investimento.
Aqui estão os problemas conceituais desse modelo. Primeiro: para reduzir custos, o terceiro decide a localização do jogo, levando-o para onde houver um estádio disponível e, claro, onde há maior concentração de torcedores do time adversário, como flamenguistas ou corintianos. É por isso que times que vendem seus mandos costumam jogar longe de casa, frequentemente em estádios repletos de fãs do oponente.
O segundo problema: como o empresário já fixou o valor da partida e busca maximizar seus lucros, ele tende a elevar os preços dos ingressos. Ele também se aproveita da alta demanda por jogos do Flamengo e do Corinthians. Assim, você pode acompanhar debates esportivos e se indignar com a suposta elitização dos estádios, mas não percebe que, nesses casos, o que existe é apenas um aumento nos preços, decorrente de um agente anônimo.
Além disso, há uma terceira questão problemática: os lucros gerados não são apropriados pelos clubes, mas sim por indivíduos que não aportam valor real à cadeia do futebol. O papel deles é simplesmente minimizar o risco financeiro de uma partida, assegurando que um dirigente obtenha um lucro garantido — um valor que ele mesmo poderia conquistar ao promover o jogo, vendendo os ingressos e ficando com toda a receita líquida. Se a partida vai ocorrer longe, por que não manter o lucro?
Esse tipo de negócio persiste em grande parte nas sombras há anos, sem a intervenção da CBF ou dos clubes, e sem que o público saiba quem são, efetivamente, esses empresários. E a pergunta que fica é: por quê?