113 anos do Maior Alvinegro do Mundo
Há 113 anos, no dia 14 de abril de 1912, um domingo à tarde, diversos jovens embarcaram no mesmo bonde rumo à Praça do Rosário. O Clube Concórdia, escolhido como local da reunião, estava localizado na Rua do Rosário, 18 (hoje conhecida como João Pessoa). Eles subiram as escadas que conduziam ao amplo salão da sede do clube.
A quantidade de jovens era notável. Entre eles estavam Arnaldo Augusto Millon, de apenas 15 anos, filho do Capitão Millon, e seu irmão, Adolpho Millon Junior, com 16 anos. Também havia rostos familiares, como o de Harold, de 27 anos, um dos sobreviventes do primeiro movimento futebolístico da cidade, que ocorreu uma década antes, em 1902, na praia do Embaré.
Estudantes e jovens esportistas predominavam entre os presentes. O salão foi gradualmente se preenchendo até que Raymundo Marques subiu ao palco.
Raymundo abordou a situação do futebol na cidade, desde que o Internacional havia encerrado suas atividades e o Americano se mudado para São Paulo. Ele discursou sobre o crescimento do esporte tanto na capital quanto no interior e a perda da representação do município no futebol.
Em seguida, Raymundo afirmou que não tinha intenção de assumir a presidência. Ele revelou que havia conversado com Sizino Patusca e George Cox, sugerindo que a Assembleia aceitasse suas nomeações para presidente e vice-presidente, respectivamente. A proposta foi aprovada com aplausos.
Com um tom descontraído, Raymundo lembrou aos presentes que ainda não tinham um nome para o novo clube: “Os senhores acreditaram na ideia e aprovaram a indicação de um presidente, mas ainda não definimos o nome. Convido a todos a compartilhar suas sugestões.”
África, Brasil e Concórdia foram algumas das opções lembradas, mas não agradaram e foram rejeitadas. A tarefa de nomear um clube parecia tão desafiadora quanto escolher um nome para um filho. Foi nesse momento que Edmundo Jorge de Araújo, filho do respeitado Sóter de Araújo, chamou a atenção da plateia.
“Senhores! Estamos em Santos. Esta é a nossa cidade. Este time representa a nossa gente, a nossa terra. Por que não Santos? Santos Foot-ball Club.”
A sugestão de Edmundo gerou murmúrios de aprovação. Raymundo, por sua vez, parecia convencido. “Colocarei em votação.” As palmas se espalharam pela sala, celebrando a ideia.
E assim, foi fundado o Santos Foot-ball Club.
A segunda-feira amanheceu radiante. O futebol estava renascendo na cidade. Antes de iniciar suas atividades, leitores paravam em lojas e bancas para adquirir os jornais locais.
O jornal A Tribuna deu destaque ao novo clube. Na seção de esportes, estava registrado para a posteridade:
O Santos Football Club acaba de ser fundado nesta cidade, um clube de football destinado a uma vida longa e cheia de vitórias, contando com os melhores elementos desta terra. Eis a sua primeira diretoria: Presidente, Sizino Patusca; Vice, George P. Cox; 1º Secretário, José Guilherme Martins; 2º, Raul Dantas; 1º Tesoureiro, Leonel Silva; 2º, Dario Ferraz da Frota. Diretores: Augusto Bulle, João Carlos de Mello, Henrique Tross, Raymundo Marques, Cícero F. de Lima Júnior e Camyro Faeter.
Cores do novo clube: Branco e azul, com um friso amarelo entre essas duas cores.
Nos primeiros anos, o Santos se consolidou como um clube familiar, com muitos jogadores e dirigentes unidos por laços de parentesco. Além do amor pelo esporte, havia uma conexão histórica dessas pessoas com o futebol na cidade, desde suas origens até as experiências em outros clubes até a fundação do Santos.
Se olharmos mais a fundo, poderemos notar que os fundadores do Santos estavam conectados às realizações de seus antepassados. A população de Santos na época era pequena (cerca de 90 mil habitantes), mas ignorar esses fatores é desconsiderar a história e o presente texto refuta essa hipótese.
Podemos rastrear as relações familiares de vários personagens, começando por Agnello Cícero de Oliveira, que foi presidente do Santos nos primeiros anos do clube (1914 a 1917) e liderou a aquisição do terreno e a construção da Praça de Esportes, o futuro estádio da Vila Belmiro. Ele presidiu o Santos em três ocasiões e também liderou a transição para a profissionalização do futebol entre 1932 e 1933.
Agnello era irmão de Ricardo Pinto de Oliveira, que fez parte do primeiro time do Santos em 1913 e também ocupou uma posição de direção no clube. Ricardo era primo e marido de Ismênia da Silveira Pinto de Oliveira, uma figura respeitada na cidade, ativa em círculos sociais, religiosos, esportivos e assistenciais. Ismênia tinha irmãos, Arnaldo e Oswaldo Silveira, que também jogavam pelo Santos. Assim, Ricardo se tornava não apenas um colega de equipe, mas também cunhado e primo de Arnaldo e Oswaldo.
Em 1918, Randolfo e Américo Pinto de Oliveira, outros irmãos de Agnello e Ricardo, se juntaram ao clube, enquanto Virgílio Pinto de Oliveira, o Bilú, também um dos irmãos Pinto de Oliveira, fez parte da equipe de 1918 e se destacou como o primeiro treinador a conquistar um título paulista pelo Santos em 1935.
Sua única irmã, Iraídes Ricardina de Oliveira Ratto, conhecida como dona Didi, foi a primeira costureira do clube, responsável pelos primeiros uniformes usados nas partidas, além de confeccionar a primeira bandeira do time. Casada com Francisco José Ribeiro Ratto, ou Nhonhô Ratto, ele teve papel fundamental para o Santos, sendo o responsável pela operação de um burro atrelado a um pesado rolo compressor usado para nivelar o primeiro campo do clube em Villa Macuco.
Além disso, Arnaldo e Oswaldo Silveira, Iraídes, Agnello Cícero, Randolfo, Virgílio, Américo e Ricardo Pinto de Oliveira eram sobrinhos do primeiro presidente do Santos, Sizino Patusca, fazendo deles primos dos jogadores Ary, Ararê e do famoso Araken Patusca. A única filha de Sizino, Aracy Patusca, foi casada com o jogador Siriri, que formou, junto com seu irmão Camarão e o cunhado Araken, o lendário ataque dos 100 gols em um único campeonato.
Além disso, eles eram primos de Francisco Martins dos Santos, jogador na década de 1920 e importante historiador da cidade, filho de Valentina Guiomar Patusca Martins dos Santos (irmã de Sizino) e de Américo Martins dos Santos. Francisco também era pai de Alzira Martins Lichti, uma figura notável no campo da educação na região, que fundou o Clube Feminino Santista e organizou a primeira equipe de basquete feminino de Santos, além da primeira torcida uniformizada feminina do Santos Futebol Clube. Alzira era casada com o diplomata Armando Lichti, que foi presidente do Santos entre 1922 e 1923.
Conforme o clube se desenvolvia, novos jovens se tornavam sócios. A maioria deles eram estudantes ou empregados no comércio, solteiros e com idades variando de 15 a 24 anos (66%). Isso demonstra a força de um esporte que estava rapidamente se tornando popular. Nos anos 1910, o futebol transformava-se em um dos esportes mais apreciados, e o Santos Foot-ball Club, com suas diversas conquistas, se firmou como um clube democrático, livre de preconceitos de idade, gênero ou raça.